Não é apenas mais um sensor coletor de dados - agora é um implante neural que faz computações em tempo real.
[Imagem: Columbia Engineering]
Bioeletrônica
De aparelhos eletrônicos de vestir até peles eletrônicas e curativos inteligentes, há uma ampla gama de tecnologias que poderão ser viabilizadas com circuitos eletrônicos flexíveis e biocompatíveis.E o material que acaba de ser sintetizado por Patricia Perfect e colegas da Universidade de Colúmbia, nos EUA, dá um salto qualitativo em relação a tudo o que já havia sido feito nessa área.
Eles criaram transistores iônicos biocompatíveis, capazes de realizar computações neurológicas em tempo real, usando um material compósito que também conduz elétrons, o que significa que passa ser possível criar componentes eletrônicos e bioeletrônicos usando o mesmo material.
Vale lembrar que os componentes computacionais tradicionais são eletrônicos porque usam os elétrons como portadoras de carga elétricas; enquanto isso, os seres vivos são fortemente baseados em correntes que usam íons como portadoras de cargas, como ocorre nas sinapses das células nervosas.
Com o novo material, a equipe afirma ser possível fabricar circuitos bioeletrônicos rápidos, sensíveis, biocompatíveis, macios e flexíveis, e que ainda apresentam estabilidade a longo prazo em ambientes fisiológicos desafiadores - para os circuitos eletrônicos tradicionais - como o corpo humano.
A equipe está particularmente interessada em testar novos métodos de diagnóstico e monitoramento de doenças neurológicas, começando pela substituição dos atuais sensores neurais metálicos, rígidos e agressivos, por dispositivos macios e flexíveis - muito mais biologicamente amigáveis - e capazes de executar tarefas computacionais no próprio dispositivo.
"Em vez de implantar grandes implantes em caixas grossas de metal para proteger o corpo e a eletrônica uns dos outros, como os usados em marcapassos e implantes cocleares e cerebrais, poderemos fazer muito mais se nossos dispositivos forem menores, flexíveis e inerentemente compatíveis com o nosso ambiente corporal," disse o professor Dion Khodagholy.
A equipe já fabricou vários tipos de implantes neurais, testados in vivo.
[Imagem: Patricia Jastrzebska-Perfect et al. - 10.1126/sciadv.aaz6767]
Transistores acionados por íons
Os transistores convencionais são feitos de silício, não podendo funcionar na presença de íons e de água - de fato, a difusão de íons faz com que eles parem de funcionar, e as células do corpo se comunicam com sinais iônicos. Por isso, os circuitos eletrônicos precisam ser totalmente encapsulados, geralmente em metal ou plástico, antes de serem implantados no corpo.Essas incompatibilidades restringem o acoplamento abiótico/biótico - interfaces entre o humano e o eletrônico - a interações capacitivas apenas na superfície do material, resultando em menor desempenho. Materiais orgânicos já foram usados para superar essas limitações, já que são flexíveis, mas seu desempenho elétrico não tem-se mostrado suficiente para executar o registro e o processamento de sinais cerebrais em tempo real.
A equipe superou o problema misturando uma série de compostos orgânicos, empilhados em camadas, que permitiram criar transistores eletroquímicos orgânicos acionados por íons que eles chamam de e-IGTs, sigla em inglês para "transistores acionados por íons" (Ion-Gated Transistor). Como os íons não precisam percorrer longas distâncias para participar do chaveamento, esses transistores podem ser ligados e desligados de forma rápida e eficiente, além de apresentar uma largura de banda que é várias ordens de magnitude maior do que a de outros transistores baseados em íons.
Implantes bioeletrônicos
Os pesquisadores usaram seus e-IGTs - que são uma versão otimizada de um transístor iônico apresentado pela equipe no ano passado - para coletar uma ampla gama de sinais eletrofisiológicos, como a gravação in vivo de pulsos de ação neural, incluindo unidades de processamento neural implantáveis, biocompatíveis e macias, para a detecção em tempo real de sinais neurais, como os que ocorrem durante ataques epilépticos."Estamos empolgados com estes resultados," disse a professora Jennifer Gelinas. "Mostramos que os e-IGTs representam um componente básico seguro, confiável e de alto desempenho para a bioeletrônica implantada cronicamente, e estou otimista de que esses dispositivos nos permitirão expandir com segurança o modo como usamos dispositivos bioeletrônicos para tratar doenças neurológicas".
Bibliografia
Artigo: Mixed-conducting particulate composites for soft electronicsAutores: Patricia Jastrzebska-Perfect, George D. Spyropoulos, Claudia Cea, Zifang Zhao, Onni J. Rauhala, Ashwin Viswanathan, Sameer A. Sheth, Jennifer N. Gelinas, Dion Khodagholy
Revista: Science Advances
Vol.: 6, no. 17, eaaz6767
DOI: 10.1126/sciadv.aaz6767
Artigo: Enhancement-mode ion-based transistor as a comprehensive interface and real-time processing unit for in vivo electrophysiology
Autores: Claudia Cea, George D. Spyropoulos, Patricia Jastrzebska-Perfect, José J. Ferrero, Jennifer N. Gelinas, Dion Khodagholy
Revista: Nature Materials
DOI: 10.1038/s41563-020-0638-3
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