Conheça a empresa de medicina nuclear que já vale R$ 100 milhões

O Grupo RPH surgiu como uma consultoria em medicina nuclear. Hoje, atua como uma solução completa para clínicas e hospitais comprada pelo grupo de saúde Ygeia Medical



Laboratório de manipulação do Grupo RPH (Foto: Grupo RPH/Divulgação)

Todos os olhos estão voltados para as startups que estão trazendo soluções para combater a pandemia de Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. Mas outras healthtechs estão conseguindo fechar aportes e até mesmo saídas (no linguajar das startups, exits).

É o caso do Grupo RPH, vendido para o grupo de saúde Ygeia Medical em março. A transação avaliou o empreendimento em cerca de R$ 100 milhões.

O RPH trabalha no ramo de medicina nuclear, que emprega materiais radioativos para diagnósticos e terapias para doenças como câncer e infarto do miocárdio. O empreendimento nasceu há 18 anos como uma consultoria e atua hoje como uma solução completa para clínicas e hospitais que precisam da medicina nuclear para seus exames.

Com a injeção de capital trazida pela venda, o plano é expandir para além do estado de São Paulo.

Ideia de negócio: solução completa em medicina nuclear
Cada grande hospital tem uma área de diagnóstico e terapia que faz uso da medicina nuclear. Os departamentos precisam tanto de isótopos radioativos quanto de kits com moléculas específicas para cada diagnóstico ou terapia desidratadas em baixa temperatura (um processo chamado de liofilização). Unindo esses dois compostos, uma solução radioativa chamada de radiofármaco é criada. O radiofármaco é injetado na veia do paciente e permite a visualização das imagens radiográficas de fraturas e tumores, por exemplo.

O RPH nasceu como uma consultoria de medicina nuclear em 2002, ajudando grandes hospitais a implementar sua rotina de pedir, preparar e aplicar radiofármacos. No Parque Científico e Tecnológico da PUC-RS, os empreendedores pivotaram para atender a demanda de kits com moléculas específicas. Entre 2003 e 2008, criaram e validaram seu primeiro produto: um kit para o exame de cintolografia do miocárdio.

Ao mesmo tempo, trabalharam junto da Anvisa para construir marcos regulatórios para a medicina nuclear. Segundo o cofundador Rafael Madke, o mercado era dominado por produtos importados e a startup cresceu com a proposta.

Os ganhos foram reinvestidos em kits para outros diagnósticos e terapias na medicina nuclear, especialmente os mais comuns e reembolsados por planos de saúde. Em 2010, o RPH conseguiu um investimento do fundo Criatec I. "Sabíamos que um negócio farmacêutico precisa de capital intensivo. Mas principalmente queríamos estruturar nossa contabilidade e governança e passá-las por um processo de auditoria", diz Madke.


Rafael Madke, CEO do Grupo RPH (Foto: Grupo RPH/Divulgação)

Os investidores questionaram principalmente como o RPH poderia escalar suas operações e expandir sua atuação para além da produção e venda dos kits. Uma viagem aos Estados Unidos trouxe um novo modelo de atuação: o de criar radiofarmácias centralizadas, como a americana Cardinal Health. Elas são uma espécie de farmácia de manipulação para a medicina nuclear: compram os isótopos radioativos e os kits, montam os compostos e vendem a solução pronta para as instituições de saúde.

O RPH passou a oferecer tanto apenas os kits quanto o serviço que antes precisava ser feito dentro dos hospitais. A regulação do modelo de radiofarmácia centralizada junto à Anvisa levou quatro anos e precisou de um novo investimento, feito pela Ygeia Medical em 2016.

O primeiro piloto de radiofarmácia centralizada foi instalado na Beneficência Portuguesa (São Paulo) no final de 2018. Cada instituição manda sua agenda do dia seguinte e o negócio produz e entrega as soluções radioativas em algumas horas. Essa radiofarmácia centralizada atende tanto a Beneficência quanto outros hospitais próximos. Além da escala, as instituições de saúde podem fazer compras fracionadas e reduzir o desperdício de materiais.

Nomes como A.C. Camargo, Dasa e Sírio Libanês aderiram ao conceito. A radiofarmácia centralizada na Beneficência Portuguesa disponibiliza 38 soluções diferentes para 60 clientes.

A venda dos kits ainda representa 60% do faturamento, atendendo 330 serviços de medicina nuclear brasileiros e exportando para 15 países. A representação dos kits deve diminuir para 40% com uma nova radiofarmácia no Rio de Janeiro.

Estratégia de crescimento: venda e planos para 2020
Como um novo passo para consolidar o mercado de radiofarmácia e obter um volume de investimentos maior, o RPH realizou sua venda para a Ygeia Medical. A transação avaliou o negócio em cerca de R$ 100 milhões e foi concluída no mês passado. O RPH busca agora abrir mais cinco radiofarmácias centralizadas. Os alvos para o presente e o futuro são cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Belo Horizonte, Recife e Porto Alegre.

O investimento gerou um retorno de seis vezes para o Criatec I, gerido por fundos como Antera e KPTL. O KPTL tem 50 empresas no seu portfólio atual, nove delas na área de saúde. "O RPH foi aumentando seu potencial de mercado ao longo de sua história. Há uma barreira de entrada alta e agora é uma questão de escalar para atender mais polos de saúde", diz Paulo Tomazela, sócio da KPTL.


Laboratório de manipulação do Grupo RPH (Foto: Grupo RPH/Divulgação)

A pandemia do novo coronavírus reduziu temporariamente a demanda por diagnósticos e terapias de medicina nuclear: o faturamento de março estava projetado para R$ 5,5 milhões e se encerrou em R$ 4 milhões.

"Começamos a estudar como não demitir nenhum dos nossos 110 funcionários. É um pessoal muito especializado e treinado por nós ou fora do país", diz Madke. O presidente espera crescimento real a partir de julho deste ano e ainda não há projeções para o faturamento de 2020.

O RPH também estuda como ampliar suas frentes de negócio: a logística cheia de regulações para transportar soluções radioativas pode ser aproveitada para entregar outros produtos de saúde, por exemplo. "Temos de ganhar eficiência para cobrar menos e fazer o cliente acessar mais serviços. O Ygeia Medical possuem uma base de serviços de saúde que casa com o norte que queremos dar ao RPH. Vislumbramos crescer nossa participação de mercado e trazer novos produtos e serviços, inclusive por meio de aquisições e parcerias", diz Madke.

Para Tomazela, o movimento será ajudado por um interesse crescente das healthtechs brasileiras e a volta dos investidores pós-pandemia. "Tirando quem está no olho do furacão, de ventiladores até exames e controle remoto, as healthtechs veem uma compressão. Mas o mercado continua latente e, com a Covid-19 fora da mesa, volta forte. Com o dólar na faixa dos cinco reais e nossas inovações em healthech, no segundo semestre aparece o dinheiro nacional e internacional."

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