O novo jeito de ensinar engenharia


Depois de se tornar uma das melhores escolas de negócios do país, o Insper quer formar engenheiros inovadores — e virar, mais uma vez, um bom exemplo para a educação



São Paulo - O empresário carioca Claudio Haddad se formou em engenharia mecânica em 1969. Desde então, seu diploma está na gaveta. Formado também em administração, ele partiu para um doutorado em economia na Universidade de Chicago. De volta ao Brasil em 1976, aos 29 anos, iniciou uma carreira no mercado financeiro que o levou a ser diretor do Banco Central e presidente do antigo Banco Garantia.

Nos últimos meses, porém, Haddad se reencontrou com a engenharia — mas de forma diferente. Como principal sócio do Insper, uma das escolas de negócios mais conceitua­das do país, ele coordena a criação dos cursos de engenharia mecânica, mecatrônica e da computação que a instituição vai lançar em 2015. O currículo em gestação tem pouco a ver com o das atuais faculdades brasileiras. A teoria será intercalada com a prática desde o primeiro ano.
Projetos que materializam conceitos tirados dos livros terão mais peso que as provas. O estudante será desafiado a solucionar problemas reais do mercado. Isso porque a engenharia do Insper não pretende apenas habilitar jovens para cobrir o déficit do Brasil na área, estimado em 150 000 profissionais. “Queremos formar engenheiros capazes de inovar, criar produtos e empreender”, diz Haddad.
Para tornar a ideia viável, ele tem feito um esforço pessoal. Saiu batendo de porta em porta e levantou 85 milhões de reais em doações de grupos empresariais, como Gerdau e Votorantim, de bancos, como Itaú, Bradesco e BTG Pactual, e de fundações mantidas pelos empresários Beto Sicupira, Marcel Telles e Jorge Paulo Lemann.
O trio de sócios da cervejaria belgo-brasileira AB InBev tem participação no Insper e já teve sociedade com Haddad no Banco Garantia. O périplo incluiu ainda visitas a universidades no exterior para formatar o currículo. Sua principal fonte de inspiração é o Olin College, de Massachusetts, que revolucionou o ensino de engenharia nos Estados Unidos na década passada. 
O Olin abriu as portas em 2001. Foi concebido pela Fundação Franklin W. Olin, que por quase 70 anos financiou a construção de universidades americanas. A proposta para a engenharia, desde o início, foi inovadora: formar um profissional preparado para lidar com os desafios do mundo empresarial.
O currículo incentiva os 350 estudantes a criar e a patentear novos produtos e a abrir o próprio negócio. “Olin é um laboratório”, diz Richard Miller, seu reitor. “Foi feito para que os jovens possam experimentar boas ideias.” Hoje, dez universidades no mundo aplicam o mesmo conceito, até mesmo em escala bem maior. Entre elas está a Universidade de Illinois, uma das maiores dos Estados Unidos, com 8 000 alunos de engenharia. 
A ambição de Haddad é que o curso de engenharia do Insper possa ser um paradigma similar para o ensino dessa área no Brasil. No entanto, não é simples subverter a tradição. O currículo que prima pela mão na massa desde o início não é unanimidade acadêmica no país.
“O profissional com formação focada na prática não vai muito além do nível técnico”, diz Erickson Almendra, diretor da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “São os cursos com alta carga teórica que preparam o profissional para conceber grandes projetos.” Como exemplo, Almendra cita o fato de que a teoria ocupa quatro dos cinco anos do curso nas dez melhores faculdades de engenharia da França.
Copiar o que funciona
Quem conhece o trabalho de Haddad, porém, não duvida que algo novo pode surgir na cena acadêmica nacional. Hoje com 66 anos, ele investe em educação por entender que o ensino de excelência é o caminho para deixar um legado. Haddad ingressou no setor em 1999, quando se tornou sócio do grupo de educação carioca Ibmec e passou a dirigir sua unidade paulista. Na época, a filial tinha 600 alunos e pouca visibilidade.
Em 2004, ele assumiu o controle da escola, que deixou de ter fins lucrativos e todo o resultado passou a ser reinvestido. Cinco anos depois, mudou o nome para Insper. Hoje, ela tem 5 000 alunos e é uma das sete instituições de ensino superior com nota máxima nos indicadores do Ministério da Educação. “O que faz a diferença no Insper é o Claudio Had­dad”, diz o economista Marcos Lisboa, que acabou de deixar uma vice-presidência do Itaú Unibanco e foi trabalhar no Insper. Ele será preparado para suceder Haddad no comando. 
Não é a primeira vez que Haddad replica um modelo vencedor. Parte do sucesso do Insper está no fato de reproduzir as boas práticas de outra instituição americana: a conceituada Universidade Harvard. Haddad a conhece de perto. Em 1987, foi aluno no curso de especialização em gestão de negócios.
Há oito anos, é membro do conselho externo que monitora o cumprimento das metas de Harvard. O Insper tem um conselho desse tipo, entre outras ferramentas de gestão copiadas de Harvard. Na área acadêmica, os cursos de economia e negócios — assim como serão os de engenharia — valorizam a prática.
“Faltam no Brasil entidades educacionais privadas que se dediquem à excelência do ensino e da pesquisa e possam exercer o papel que uma Harvard tem nos Estados Unidos”, diz João Grandino Rodas, reitor da Universidade de São Paulo. “O Insper é bem-sucedido nesse sentido.” Se alcançará o mesmo desempenho com a engenharia, o tempo vai mostrar.

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