A EVOLUÇÃO DA MINERAÇÃO DO FERRO – 2000 A 2011


Por Mathias Heider(*)
A valorização das cotações do minério de ferro provocou, além das expansões das áreas produtivas e novos projetos, uma corrida a novas áreas de pesquisa mineral no Brasil e no mundo. No final da década de 90 não havia uma significativa atividade de pesquisa mineral para o minério de ferro, em razão de longos ciclos de cotações deprimidas dessa commoditie nos anos 80 e 90. A partir da primeira década, com a demanda chinesa e o crescimento da economia mundial, a pesquisa mineral do minério de ferro ganha novos contornos, como veremos a seguir.
Diversos recursos de minério de ferro já historicamente conhecidos no Brasil se viabilizam, incorporando novas reservas e áreas produtivas. A partir de 2000, inicia-se um a vigorosa fase de fusões e aquisições nas minerações de ferro, a partir da venda de ativos das indústrias siderúrgicas, que não se interessavam pelo baixíssimo retorno dessa atividade, preferindo focar a fabricação de aço. Se a valorização do minério de ferro beneficiou o setor mineral, o setor siderúrgico teve uma brutal elevação de custos e perda de rentabilidade (vide fig.01). À medida que as cotações do minério de ferro e do coque foram se elevando, o seu percentual na composição dos custos fixos do aço penalizava sua produção e custo.
Percentual de Custos Minério de Ferro/Coque na Produção de Aço
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- Percentual do custo do Minério de Ferro (em azul)
- Percentual do custo do Coque (em amarelo)
Fonte: Macquarie Research estimates (set/2011)

Assim, surgiram projetos em novas fronteiras produtivas como o da ENRC (Eurasian Natural Resources Corporation), do Cazaquistão, em Caetité (BA), e a Anglo Ferrous, em Conceição do Mato Dentro (MG), com arrojados planos de futuras expansões. A ENRC também adquiriu ativos minerários no norte de Minas (MIBA e Peixe-bravo), já avaliando uma futura integração das operações. Estados como o Ceará (CE), Rio Grande do Norte (RN), Tocantins (TO) e Amapá (AP) também passaram a integrar o quadro produtivo de minério de ferro nesse período. Novas regiões da Bahia (BA), Piauí (PI) e norte de MG também estão se integrando nesse quadro.
A produção de minério de ferro do Brasil passou de 210 Mt em 2000 para 393,3 Mt em 2011, enquanto as exportações se elevaram de 3,1 bi US$ para 41,8 bi US$ no mesmo período (graf. 1 e 2). O mercado transoceânico de minério de ferro que, em 2000, era da ordem de 455 Mt, atinge cerca de 1,09 Bt em 2011, com a demanda chinesa se elevando de 70 Mt para 678 Mt (graf.3). As cotações no mercado “spot” atingiram valores recordes próximos a 200 US$/t (graf.4).
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Graf.1 - Fonte: Anuários do DNPM
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Graf.2 - Fonte: BaseAlice -MDIC
Mercado Transoceânico de Minério de Ferro
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Gráf 03 - Fonte: Diversas (Vale/BHP/MACQUARIE/Outras)
Mercado Spot: Variação das Cotações de Minério de Ferro
(2001-2011)
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Graf.4 - Fonte: www.indexmundi.com
Assim, mostramos na fig.02 abaixo, a situação dos títulos minerários para minério de ferro em 2000. Nos anos 2000 e 2001 a Vale iniciou um bem sucedido processo de fusões (Socoimex, Samitri/Samarco, Ferteco, MBR). Antes desse processo, a empresa possuía as seguintes minas: Conceição, Cauê, Timpobepa, Brucutu, Fazendão, Capanema e Urucum (MS), no Sistema Sul, e Carajás no Sistema norte. Após as aquisições, viria a constituir os sistemas Sudeste (minas da MBR e Ferteco) e Centro-Oeste. Esse crescimento permitiu lhe adquirir ainda outras empresas, atingindo o posto de 2ª maior mineradora do mundo e blindando a sua aquisição por outras companhias.
No comparativo entre a fig.02 e a fig.03, destaca-se o expressivo aumento de títulos envolvendo pesquisa mineral (áreas em verde e azul) e sua extensão a diversas novas fronteiras como a região norte de Minas Gerais e os estados da Bahia,Tocantins, Mato Grosso e Piauí, entre outros.
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Fig 02 - Fonte: CGTIG/DNPM (2012)
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Fig 03 - Fonte: CGTIG/DNPM (2012)
Os quantitativos apresentados na tab.01 permitem uma compreensão mais abragente da evolução desses direitos minerários relativos a minério de ferro verificada em cada UF no período referido (2000 a 2011).
tabela
Tab.01 - Fonte: CGTIG/DNPM (2012)
Valorização Empresarial
Com a capacidade de geração de caixa e o aumento das cotações das commodities minerais, as empresas de mineração tiveram uma enorme valorização entre 2002 e 2008, antes da crise do sub-prime, conforme ilustração abaixo extraída no site da empresa Xstrata. A Vale, impulsionada pela aquisição da mineradora canadense INCO, atingiu o posto de segunda mineradora em valor de mercado, ultrapassando a Rio Tinto, que enfrentou problemas de caixa na aquisição da ALCAN.
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Figura 05 - Fonte: Xstrata
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Fig. 06 - Fonte: Xstrata
Projetos no Brasil
O grande projeto nacional de minério de ferro é o da Serra Leste (S11D), na região de Carajás (PA), e as expansões das minas em produção na Vale. Assim, o Sistema Norte da mineradora elevará a sua produção para cerca de 230 Mtpa. Em Mina Gerais, a grande aposta é o projeto Apolo, que recentemente obteve liberação de produção pelo órgão ambiental de Minas Gerais, na região da Serra do Gandarela. Na década passada foram ativados os projetos Capão Xavier, Maquiné e Fazendão no Sistema Sul. A Vale tem ainda dois projetos na região de Corumbá, com a aquisição da Mineração Corumbaense, da Rio Tinto, em 2009, com o desafio de melhorar a logística do transporte de minério. É importante lembrar que projetos com baixos custos de produção, caso do minério de ferro, permitem um pay-back da ordem de 4 a 5 anos, com significativa redução de risco. Mas a demora no licenciamento ambiental tem refletido na elevação dos custos de produção e no risco dos empreendimentos.
Um outro enfoque da Vale são os investimentos para aproveitamento dos recursos de minérios de ferro com baixo teor como Vargem Grande, Conceição e Cauê, viabilizando, inclusive, o aproveitamento de “itabiritos silicificados”, com maior dureza, que exigem maior custo com moagem. Assim, a região do Quadrilátero Ferrífero seria imensamente beneficiada com a elevação das suas reservas minerais, dando sustentabilidade a sua produção. A Vale também anuncia um projeto no Norte de Minas com produção inicial da ordem de 600 mtpa.
Na área de pelotização, a Vale desenvolve a VIIIª usina em Tubarão. A Samarco desenvolve a IVª usina em Úbu. Empresas como a CSN, Usiminas e Ferrous também avaliam a construção de outras plantas. É importante citar o processo de internacionalização da Vale com a construção de usinas de pelotização em Omã e na China, além da construção de centros de distribuição na Ásia, reduzindo o impacto do custo de frete em relação aos concorrentes da Austrália. A empresa ainda desenvolve o projeto Simandou e Zogota, na Guiné, com um investimento inicial na aquisição dos títulos minerários da ordem de US$ 2,5 bi.
A região do Norte de Minas atraiu várias empresas após a valorização do minério de ferro e já assiste à realização de diversos negócios de fusão e aquisição. O grupo chinês Honbridge adquiriu ativos da Votorantim Novos Negócios (Sul Americana Metais- SAM) e avalia projeto da ordem de 25 Mtpa, escoando a produção por Ilhéus (BA). As ferrovias FIOL e Transnordestina tem um papel fundamental na viabilização desses projetos.
A CSN também anuncia investimentos na expansão da mina Casa de Pedra (Congonhas/MG) e da Namisa. A MMX desenvolve projetos de exploração no Chile, tem áreas de extração no Mato Grosso do Sul e Minas Gerais e pretende atingir um patamar de produção de 26 Mtpa. Também realizou acordo com a Usiminas Mineração para explorar a mina Pau de Vinho liberando, assim, o “pit final” das áreas e aumentando a reserva lavrável.
A Arcellor adquiriu os ativos minerários da London Miniing na Serra Azul (antiga Minas Itatiauçu) por cerca de US$ 800 milhões, além de receber de volta a Mina do Andrade (antes arrendada à Vale pela Belgo Mineira, que foi adquirida também pela Arcellor). Com o processo de integração vertical, a Arcellor já pode ser inserida como a 5ª maior mineradora de ferro mundial, com um ambicioso programa mundial de aquisições e participações. A Vallourec&Manesmann também avalia a implementação de uma usina de pelotização para atender sua nova fábrica de tubos em Jeceaba(MG), em parceria com a Sumitomo.
A Usiminas adquiriu os ativos da J Mendes (4 minas) e pretende expandir as operações para um nível de 29 Mtpa, além de avaliar um projeto de pelotização. A Gerdau reavaliou recentemente o volume de suas reservas de minério de ferro para 2,9 Bt. Recentemente, a Usiminas arrendou a MBL, na região de Serra Azul, em uma nova modalidade de aquisição, diluindo o prazo de pagamento e variando o preço das parcelas de acordo com a cotação do minério de ferro.
Assim, as siderúrgicas Arcellor, Usiminas, CSN e Vallourec trabalham com um alto grau de verticalização a partir de minas próprias, garantindo maior competitividade à produção. A Vale, por sua vez, estará reestruturando seu mercado interno através de participação em diversos projetos siderúrgicos no Brasil. Por outro lado, existem indícios de que poderá haver fusão da Usiminas com a CSN ou a Gerdau, cujas sinergias podem gerar fortes reduções de custo. Em um momento em que a capacidade ociosa da siderurgia mundial se encontra em torno de 550 Mt, a competitividade das siderúrgicas brasileiras poderá manter seus níveis de expansão e a continuidade das exportações, sem necessidade de subsídios.
A Ferrous, que possui 4 ativos minerários e trabalha a recuperação ambiental visando a operacionalização de 2 minas, anunciou ambicioso projeto em Presidente Kennedy (ES), com mineroduto, porto e um complexo de pelotização. A Ferrous tem a mina de Viga, que é um ativo bastante interessante para a CSN pois se situa na região de Congonhas, na vizinhança da Casa de Pedra. A Ferrous anunciou projetos com capacidade da ordem de 25 Mtpa na primeira etapa e 50 Mtpa numa 2ª etapa. A empresa possui, ainda, uma área em Jacuípe (BA), com potencial de produção da ordem de 10 Mtpa. A Itaminas foi adquirida pela ECE (China) por cerca de US$ 1,2 bi. No Rio Grande do Norte, a empresa Mhag ainda está sendo avaliada para aquisição pela Steel Mineração.
A Vetorial Mineração e a ALL Logística anunciam o projeto Vetria, na região de Corumbá (MS), com capacidade da ordem de 20 Mtpa e escoamento da produção por trem e pelo porto de Santos (SP), envolvendo recursos de cerca de R$ 7 bi. O projeto da Mineração Manabi prevê investimentos da ordem de US$ 2,8 bi em reservas de minério de ferro no Morro do Pilar e Santa Maria do Itabira, na região central mineira. A logística estudada pela Manabi considera a construção de um mineroduto de cerca de 150 km, ligando a mina de Morro do Pilar a Ipatinga, no Vale do Aço, de onde o insumo seguiria por ferrovia até o Espírito Santo. O trajeto em direção ao porto de Linhares seria complementado por um ramal ferroviário de 90 km.
Outra tendência é a exploração de minas com reservas menores, aproveitando as altas cotações do minério de ferro. Citamos o projeto da Mineração Vila Rica (AP), que explora uma jazida da ordem de 10 Mt de hematita. Há situações semelhantes no Ceará e em Tocantins, com minério sendo lavrado através de liberação por Guia de Utilização. Diversas empresas avaliam novos projetos no setor de minério de ferro, incluindo a opção de reabertura de minas desativadas e o reaproveitamento de minérios de barragens de rejeito.
Conclusões
Diversos novos projetos situados em várias regiões no interior do Brasil terão um importante impacto na elevação do “Valor da Produção Mineral” (VPM) brasileira, a medida que forem entrando em produção, com forte potencial no desenvolvimento regional e geração de empregos e renda. Somente para o minério de ferro, existem projetos em distintas etapas que permitirão o acréscimo da produção nacional em torno de 450 a 500 Mtpa até o ano de 2020.
O desenvolvimento da pesquisa mineral do minério de ferro permite traçar um cenário bastante otimista em relação à sustentabilidade de sua produção e à capacidade de atender as futuras demandas mundiais por parte do setor siderúrgico mundial. A Vale, bastante atenta a sua estratégia de disseminação, está desenvolvendo a formação de centros de distribuição de minérios na Ásia, podendo inclusive atender a outros tipos de minerais produzidos no Brasil e por outras empresas de mineração.
Uma projeção conservadora, da ordem 0,5% de sucesso nessas pesquisas, permite estimar cerca de 60 novas jazidas, garantindo a sustentabilidade das reservas e da vocação de produção de minério de ferro no Brasil. Para 2030, o Plano Nacional de Mineração estima a produção brasileira em cerca de 1,1 BT (cenário otimista), enquanto a consultoria Raw estima uma produção mundial da ordem de 3,5 Bt. No Graf.04 observa-se a dimensão das cotações desse insumo. Em 2011, as exportações totais do Brasil atingiram US$ 256 bi e as importações, US$ 226 bi (saldo de US$ 29,8 bi). Considerando que exportações de minério de ferro foram de US$ 41,8 bi, seu percentual em relação às exportações totais do Brasil evoluiu de 5% em 2001 para 16,3% em 2011. Entre 2001 e 2011(inclusive), o minério de ferro totalizou cerca de US$ 140 bi de exportações, além de dinamizar diversas cadeias produtivas e de serviços no País.
A evolução das pesquisas minerais de ferro vem apenas confirmar a favorabilidade da geologia brasileira para essa substância. O Brasil já avalia a 3ª onda na produção de minério ferro, buscando o aproveitamento de minério itabiríticos silicificados (duros) e surge, também, uma 4ª onda, com a viabilidade de aproveitamento dos itabiritos pobres (20 a 30%Fe), com elevadíssimo potencial para elevação das reservas de minério de ferro do País. As novas fronteiras de produção de minério de ferro devem ser cuidadosamente planejadas em termos de suas potencialidades e fragilidades, garantindo seu fornecimento ao mercado interno e externo. As necessidades de logística devem ser cuidadosamente avaliadas, de forma que apóiem a viabilização econômica desses projetos. É importante frisar que a competitividade da siderurgia brasileira também deve ser continuamente avaliada para que possibilite agregação de valor às exportações do Brasil.
Citamos também algumas tendências na mineração de ferro
· Continuidade do processo de aquisição de pequenas mineradoras à ganhos de escala e sinergia e acesso a logística;
· Reaproveitamento dos resíduos das barragens de rejeito;
· Novos projetos e expansões à grande potencial de elevação de produção;
· Aproveitamento de itabiritos silicificados duros;
· Criticidade do uso da água nas novas fronteiras produtivas (norte de Minas Gerais e região Nordeste);
· Maior variação dos preços do minério de ferro;
· Automação das minas e uso de modelagem/simulação de processos;
· Verticalização das siderúrgicas e mineradoras;
· Impacto das exigências ambientais e de sustentabilidade;
· Elevação da concentração das siderúrgicas e redução de concentração das mineradoras;
· Novas tecnologias na siderurgia com maior aproveitamento de minério e insumos;
· Otimização nas operações logísticas (porte dos navios, ferrovias, portos, etc);
· Aquisição de participações nas mineradoras pela China e outros países asiáticos;
· Reativação de minas e reconfiguração dos planos de lavra;
· Volatilidade de mercados (demanda/oferta e possibilidade de crises localizadas);
· Continuidade do processo de mudanças do sistema de precificação do minério de ferro;
· Surgimento de novos players mundiais (Anglo, FMG, CSN/Namisa, etc);
· Elevação das taxações na produção de minério de ferro;
· Aumento do risco de produção: cotações, ações nacionalistas, falta de recursos humanos, etc;
· Pressões governamentais por agregação de valor ao longo das cadeias produtivas;
· Crescente impacto da necessidade de fornecimento de água e energia aos projetos de mineração.
Produção Mundial de Aço
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Graf.05 - Fonte: IISI
Evolução da Produção de Aço
(2000-2010)
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Tab 02 - Fonte: IISI
Referências
(*) Mathias Heider é engenheiro de minas do DNPM
Fonte e demais informações: http://www.inthemine.com.br/mineblog/?p=1119

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