Inovação Tecnológica, Incentivos Fiscais e Linhas de Crédito

Quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

A despeito do país ainda estar engatinhando na área de inovação tecnológica, especialmente no que diz respeito a dispêndios nacionais em pesquisa e desenvolvimento ("P&D") em comparação aos grandes países investidores, podemos dizer que o Brasil vem caminhando a passos largos quando se trata de incentivos fiscais à inovação tecnológica. Mais de quinze anos após a promulgação da primeira lei de incentivos fiscais[1] gerais[2] (conhecidos como PDTI e PDTA), pode-se dizer que o Brasil dispõe atualmente de uma boa gama de mecanismos de fomento e estímulo à inovação tecnológica, os quais tentaremos melhor examinar a seguir:

(a) Conceito de Inovação e Inovação Tecnológica

Segundo o Manual de Oslo, "as atividades de inovação incluem todas as etapas científicas, tecnológicas, organizacionais, financeiras e comerciais que realmente conduzem, ou que pretendem conduzir, à implementação de inovações. Algumas dessas atividades podem ser inovadoras em si, enquanto outras não são novas mas são necessárias para a implementação".

Por outro lado, a empresa deve se atentar que, também segundo o Manual de Oslo, "a inovação compreende várias atividades que não se inserem em P&D, como as últimas fases do desenvolvimento para pré-produção, produção e distribuição, atividades de desenvolvimento com um grau menor de novidade, atividades de suporte como treinamento e preparação de mercado, e atividades de desenvolvimento e implementação para inovações tais como novos métodos de marketing ou novos métodos organizacionais que não são inovações de produto nem de processo. As atividades de inovação podem também incluir a aquisição de conhecimentos externos ou bens de capital que não são parte da P&D". Estas atividades, regra geral, não podem usufruir de benefícios fiscais.

Conforme a legislação nacional vigente[3], inovação tecnológica é "a concepção de novo produto ou processo de fabricação, bem como a agregação de novas funcionalidades ou características ao produto ou processo que implique melhorias incrementais e efetivo ganho de qualidade ou produtividade, resultando maior competitividade no mercado".

Nesse sentido, importante observar que a legislação refere-se a produto e/ou processo novo (ou aprimorado) para a empresa, não sendo, necessariamente novo para o mercado/setor de atuação, podendo ter sido desenvolvida pela empresa ou por outra empresa/instituição. Ademais, a inovação pode resultar de novos desenvolvimentos tecnológicos, de novas combinações de tecnologias existentes ou da utilização de outros conhecimentos adquiridos pela empresa.

(b) Incentivos fiscais

A Lei nº 10.973/04 ("Lei de Inovação"), regulamentada pelo Decreto nº 5.563/05, foi organizada de forma a estimular (i) a construção de ambientes especializados e cooperativos de inovação; (ii) a participação de instituições públicas científicas e tecnológicas ("ICTs") no processo de inovação; (iii) a inovação nas empresas; e (iv) o inventor independente, bem como autorizar a instituição de fundos mútuos de investimento em empresas cuja atividade principal fosse a inovação. No que diz respeito ao estímulo à inovação nas empresas, a Lei de Inovação prevê a concessão de recursos financeiros sob a forma de subvenção econômica, financiamento ou participação societária. Ademais, a Lei de Inovação passou a permitir a contratação, por órgãos e entidades da administração pública, do desenvolvimento de tecnologias ao prever que tais órgãos e entidades "poderão contratar empresa, consórcio de empresas e entidades nacionais de direito privado sem fins lucrativos voltadas para atividades de pesquisa, de reconhecida capacitação tecnológica no setor, visando à realização de atividades de pesquisa e desenvolvimento, que envolvam risco tecnológico, para solução de problema técnico específico ou obtenção de produto ou processo inovador".

A Lei nº 11.196/05 ("Lei do Bem"), regulamentada pelo Decreto nº 5.798/06, buscou consolidar os incentivos fiscais à inovação tecnológica. Uma das mais importantes novidades foi o fim da necessidade de submeter e aprovar previamente projetos junto ao governo para fins de utilização dos incentivos fiscais, que resumidamente são os seguintes:

(i)
deduções de Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido de dispêndios realizados no período de apuração com P&D;

(ii) redução de 50% (cinqüenta por cento) do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI incidente sobre equipamentos, máquinas, aparelhos e instrumentos, bem como os acessórios sobressalentes e ferramentas que acompanhem esses bens, destinados à P&D;

(iii) depreciação integral, no próprio ano da aquisição, de referidos bens, para efeito de apuração do IRPJ e da CSLL[4]; e

(iv) amortização acelerada dos dispêndios relativos à aquisição de bens intangíveis, vinculados exclusivamente às atividades de P&D.

A Lei do Bem ainda prevê outros benefícios, como (i) a subvenção, pela União, por intermédio das agências de fomento de ciências e tecnologia, do valor da remuneração de pesquisadores, titulados como mestres ou doutores, empregados em atividades de inovação tecnológica em empresas localizadas no território brasileiro e; (ii) a exclusão, do lucro líquido, dos dispêndios efetivados em projeto de pesquisa científica e tecnológica e de inovação tecnológica a ser executado por ITCs, para fins de apuração do lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL.

É importante mencionar que embora a Lei do Bem tenha concedido uma série de benefícios fiscais relevantes, na sua grande maioria, tais benefícios alcançam apenas as empresas optantes pelo regime de apuração do imposto de renda com base no lucro real, pois muitos se referem a deduções na apuração da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Além disso, a manutenção ao direito de fruição destes benefícios depende do cumprimento dos requisitos abaixo, o que dificulta o acesso de muitas empresas:

(i) envio do formulário ao Ministério da Ciência e Tecnologia;
(ii) preparação de documentação/contabilização em conta específica;
(iii) manutenção da regularidade fiscal; e
(iv) apresentação de pareceres e laudos técnicos de engenharia.


Vale lembrar que a Lei nº 11.774/08 alterou a Lei do Bem para alcançar também as empresas beneficiárias da Lei nº 8.248/91 ("Lei de Informática"), antes totalmente excluídas de seus benefícios. Assim, no tocante às atividades de informática e automação, tais empresas passaram a poder beneficiar-se das deduções de 160% a 180%[5] dos dispêndios realizados em P&D para efeito de apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL. Adicionalmente, no tocante às demais atividades não beneficiadas pela Lei de Informática, a Lei do Bem passou a permitir que estas empresas usufruíssem de todos os seus benefícios.

(c) Linhas de crédito e subvenção

Por fim, cumpre ressaltar que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES fortaleceu, nos últimos anos, as linhas de crédito dedicadas à inovação tecnológica, ao passar a tratar o apoio à inovação como uma prioridade estratégica. Neste sentido, o BNDES estruturou duas linhas de crédito: (i) a Linha Capital Inovador visando apoiar empresas no desenvolvimento de capacidade para empreender atividades inovativas em caráter sistemático e a (ii) Linha Inovação Tecnológica visando apoiar projetos de inovação de natureza tecnológica que busquem o desenvolvimento de produtos e/ou processos novos ou significativamente aprimorados (pelo menos para o mercado nacional) e que envolvam risco tecnológico e oportunidades de mercado. Ademais, o BNDES criou o Fundo Tecnológico (Funtec), com recursos não reembolsáveis, para apoiar projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação em áreas de notória relevância nacional, que permitam aproveitar oportunidades estratégicas e nas quais o país possa desenvolver liderança (e.g., saúde, energias renováveis e meio ambiente). Outros programas do BNDES voltados à inovação tecnológica são o Criatec (Capitalização de micro e pequenas empresas inovadoras de capital semente) e o Prosoft (Programa para o Desenvolvimento da Indústria de Software e Serviços de Tecnologia da Informação).

Importante, ainda, mencionar: (i) a Lei nº 10.332/01 que instituiu mecanismo de financiamento para o Programa de Ciência e Tecnologia para o Agronegócio, para o Programa de Fomento à Pesquisa em Saúde, para o Programa Biotecnologia e Recursos Genéticos - Genoma, para o Programa de Ciência e Tecnologia para o Setor Aeronáutico e para o Programa de Inovação para Competitividade; e (ii) a Lei 12.096/09 que , por sua vez, autorizou a União a conceder subvenção econômica ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES, sob a modalidade de equalização de taxas de juros, nas operações de financiamento contratadas até 31 de dezembro de 2010, destinadas à aquisição e produção de bens de capital, à produção de bens de consumo para exportação e à inovação tecnológica.
Miranda Blau

Notas
[1] Lei nº 8.661/93 (revogada pela Lei nº 11.196/05) que previa, dentre outros incentivos, (i) a dedução do Imposto de Renda dos dispêndios, em atividades de P&D; (ii) a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados incidente sobre equipamentos, máquinas, aparelhos e instrumentos, bem como os acessórios sobressalentes e ferramentas que acompanhem esses bens, destinados à P&D; (iii) a depreciação acelerada de referidos bens; (iv) a amortização acelerada dos dispêndios relativos à aquisição de bens intangíveis, vinculados exclusivamente às atividades de P&D; (v) o crédito de 50% do Imposto de Renda retido na fonte e redução de 50% do Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro ou relativos a Títulos e Valores Mobiliários, incidentes sobre os valores pagos, remetidos ou creditados a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior, a título de royalties, de assistência técnica ou científica e de serviços especializados, previstos em contratos de transferência de tecnologia devidamente averbados. Todavia, para usufruir dos benefícios as empresas deveriam apresentar previamente programas de desenvolvimento industrial ou tecnológico agropecuário a serem analisados e aprovados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia.[2] Nesta época, já estava em vigor a Lei nº 8.248/91 (renovada pela Lei nº 10.176/01) específica para o setor de informática e telecomunicações.[3] Decreto nº 5.798/06, artigo 2º, inciso I (regulamenta a Lei do Bem).[4] Conforme redação dada pela Medida Provisória nº 428/08, convertida na Lei nº 11.774/08.[5] O percentual varia em função do número de empregados pesquisadores contratados pela empresa.

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